domingo, 13 de janeiro de 2013

A virgem de 40 – Agora ou nunca


Imagem retirada do site da campanha.

A minha peregrinação pela 39ª Campanha de Popularização do Teatro e da Dança de Belo Horizonte teve como largada a peça A virgem de 40 – Agora ou nunca, o que me trouxe também a oportunidade de adentrar pela primeira vez o Teatro ICBEU – que também está na casa dos 40, mas não é mais virgem, não! –, tão próximo a minha adorada Praça da Liberdade. A descrição da peça, disponibilizada na divulgação da campanha, é simples: Norma, “uma professora romântica, sonhadora e virgem”, resolve, no dia de seu aniversário de 40 anos, se dar de presente uma relação sexual, o que acaba por gerar “sucessivas situações inusitadas”. O que o público não sabe, embora provavelmente suponha em sua maioria, é que o recurso encontrado pela protagonista para a concretização do seu intento é uma agência de acompanhantes, através da qual ela tem contato com três peculiares profissionais do sexo: o “número 32” Ronaldo, cujo “Ronaldão” é, na verdade, “Ronaldinho”, e só deixa a protagonista – e a plateia – na vontade; o “número 22” Celso (mais romântico que a própria Norma), que, há vinte anos, foi aluno da protagonista, a sua primeira paixão; e o diretor da agência, um homem curiosamente caquético que se viu obrigado a ir ele próprio à casa da protagonista a fim de atender-lhe à complexa demanda. Aliás, é justamente a demanda da nossa excêntrica Norma que gera as absurdas situações: ela não apenas quer “perder a virgindade”, como também quer viver este momento tão especial fazendo “papai-e-mamãe” – posição tão ultrapassada quanto “tripé de samambaia” –, sendo chamada de amor e sendo carregada até o quarto vestida de noiva.

Neste ponto, é válido que façamos algumas considerações acerca da contraditória personalidade da professora, que valoriza o amor e a primeira vez na noite de núpcias (o que justifica o nome dado à personagem: Norma), mas que vai tentar ter tudo isso, de “mentirinha”, com um garoto de programa, fracassada que foi ao tentar concretizá-lo na vida real. E é aí que subjaz a intempérie que marcou a vida da professora, que, há vinte anos, estava noiva e, por desconhecida razão, foi abandonada pelo homem com quem sonhava ter sua primeira noite e viver para sempre em uma “casinha de janelas azuis”.

Como podemos notar, A virgem de 40 tem um bom argumento, mas a verdade é que Aziz Bajur, autor da peça, não se aproveita como pode desse argumento, e – por falha ou por escolha –, acaba desenvolvendo uma estória focada no humor, pautada no preconceito e com desfecho aquém das expectativas da plateia.

O preconceito ao qual faço menção está no desespero no qual o simples desejo da professora se transforma no decorrer da peça, levando-a ao ponto de convidar o porteiro do prédio ao seu apartamento, abduzindo-o, com uma arma, a ter uma relação sexual com ela. Tal preconceito está até mesmo no texto, onde podemos conferir dizeres como “E agora? Quem é que vai resolver o meu problema?”. Claro, talvez estejamos a exigir demais de uma peça que se propõe exclusivamente ao humor, sem, em momento algum, pretender enveredar-se por reflexões sérias acerca da questão da mulher. Mas, por outro lado, não sei se a arte (e aqui eu me refiro a um conceito estritamente pessoal de arte) está autorizada a se desviar de reflexões desse tipo.

Por outro lado, não se deve ignorar o fato de que o humor atual se dá, geralmente, alicerçado em preconceitos, o que pode, talvez, legitimar o uso e abuso do estereótipo da mulher de 40 anos desesperada por sexo, tais são as ocorrências físicas e adoção de postura mais ativa no plano social, profissional, afetivo e sexual que marcam a vida das mulheres aos 40.

Outro ponto é que a peça me parece não cumprir com a sua função catártica, em especial se considerarmos haver na plateia pessoa em condição semelhante à da protagonista. Principalmente pelo seu desfecho, que, aparentemente, mais se justifica pela necessidade de se encerrar a estória com um final meia-boca após haver alcançado sucesso com o riso. Será que a nossa protagonista necessitava, de fato, de uma relação sexual com um michê, mesmo que nocauteada pelo álcool que vai consumindo ao longo da trama? Será que ela devia mesmo desistir do seu sonho de “um amor para toda a vida”? Será que o seu ex-aluno, tão acanhado e insatisfeito com a sua condição de michê, a satisfaria a ponto de fazê-la esquecer a mágoa que lhe foi causada há vinte anos? Enfim, é claro que são respostas que devem ficar para a imaginação da plateia. O problema, porém, é que a trama carece de elementos que possibilitem ao espectador o sonho pós-espetáculo.

Merece destaque, porém, a transformação, inclusive física, pela qual Norma vai passando ao longo da trama. Da recatada mulher de óculos, cabelos presos e camisola longa à sedenta mulher de linguajar chulo, longos cabelos anelados e camisola sexy de cor vermelha, vai se revelando a loba. E merecido destaque, também, para a Ivonete, atendente da agência de acompanhantes, a quem só conhecemos por via das sucessivas ligações da protagonista, mas que nem por isso deixa de nos arrancar muitos risos. “Nós não temos ‘qualquer um’. Só trabalhamos com profissionais altamente qualificados”.

Conclui-se, então, que A virgem de 40 – Agora ou nunca tem, sim, alguns problemas que podiam ser solucionados aproveitando-se melhor o seu argumento. Mas, a despeito disso, trata-se de uma peça que, como todas as peças participantes da campanha, deve ser vista e aplaudida de pé, pois os atores, o diretor, o autor e todos os envolvidos merecem. Tal como você que, não só durante a campanha, mas durante o ano inteiro, merece ir ao teatro para rir e chorar com as Normas da vida!

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