domingo, 27 de janeiro de 2013

De pernas pro ar 2


Título original: De Pernas Pro Ar 2
Ano: 2012
Direção: Roberto Santucci
Roteiro: Paulo Cursino, Ingrid Guimarães, Marcelo Saback
Gênero: Comédia
Origem: Brasil
Duração: 95 minutos


O prazer não tem limites! E Alice Segretto (Ingrid Guimarães), vai levar isso ao pé da letra e expandir os negócios da “Sex Delícia” à capital cultural do mundo: Nova Iorque. E aí está boa parte da graça de De pernas pro ar 2. Quem, ao assistir o trailer, previu muita risada diante das trapalhadas de Alice em Nova Iorque, não vai se decepcionar. Aliás, uma das muitas verdades que têm sido ditas sobre o longa é o fato de ser ele um dos raros casos em que a sequência supera o original. É isso mesmo. Esta sequência do filme de Roberto Santucci – que conta, inclusive, com a própria Ingrid Guimarães na produção do roteiro – potencializa os acertos do anterior, cria novas piadas e comete novos erros, totalmente perdoáveis a meu ver. Vamos a tudo isso.

Antes de chegar à América, Alice vai passar um mau bocado, desmaiando sobre um bolo bem peculiar no lançamento da centésima loja da “Sex Delícia”; sendo colocada no chinelo pela linda, bem-sucedida e faz-tudo Vitória (Christine Fernandes) e cometendo loucuras em uma reunião com investidores após ingerir seu calmante com champanhe. E como se não bastasse, a pobre ainda vai parar em um spa dirigido pela severa Regina (Alice Borges). Nada disso, porém, é suficiente para parar Alice, que, para escapar do spa e continuar tocando o seu voluptuoso negócio, recorre aos serviços do hacker e contrabandista de eletrônicos Leozinho (Wagner Santisteban), além de proporcionar um orgasmo à “sargentona” Regina. No spa, aliás, todas essas figuras – com destaque para o Mano Love (Luiz Miranda), antipático, mas cômico – são hilárias. Tanto quanto o orgasmo alcançado por Alice, ao som de Byafra, por via do estranho objeto de oito tentáculos – ou testicles (trocadilho infame, porém engraçadíssimo, utilizado no filme) – que viria a ser a chave para o sucesso da “Sex Delícia” em Nova Iorque.

Contudo, devem ser considerados pontos que eu nem chamaria de falhas, visto que surtem efeito (o riso) e não prejudicam o filme. Um deles é aquela espécie de reformulação da cena de Alice à mercê de um “brinquedinho”, desta vez não controlado pelas ondas sonoras durante o jogo de futebol do filho (João Fernandes, no primeiro filme), mas pelo controle remoto, manuseado, involuntariamente, por João (Bruno Garcia). Outro ponto é a previsível cena do restaurante, exibida à exaustão em produções norte-americanas e até em novelas do SBT. Me recordo de haver visto algo do tipo, pela primeira vez, em Uma babá quase perfeita (1993). Conforme já dito, porém, são pontos que, embora representem um pequeno pecado em termos de criatividade, surtem o efeito esperado e estão bem onde estão.

Ademais, quaisquer falhas são compensadas pelo brilhante elenco. Ingrid Guimarães continua a nos surpreender com o seu talento. Cristina Pereira ganha maior destaque e a sua personagem Rosa mostra que não está ali a passeio, tal como a perfeita Denise Weinberg, para quem parece não haver tempo ruim. Maria Paula, muito criticada desde o primeiro filme (críticas com um quê de exagero, a meu ver), continua defendendo bem a sua Marcela. E até o Paulinho (Eduardo Melo, nesta sequência) se sai bem em suas raras falas. E, havendo mencionado a cena do restaurante no parágrafo anterior, não se pode desconsiderar a rápida, porém intensa, participação de Rodrigo Sant’Anna, que, em sua última cena, até utiliza um dos bordões de sua personagem Valéria Vásquez. A referência a bordões do pretenso humorístico Zorra Total, aliás, não é uma novidade em filmes nacionais. A diferença é que, enquanto soou como uma patética estratégia em Xuxa Gêmeas, ficou funcional e dentro de contexto em De pernas pro ar 2. Quanto a Ricardo (Eriberto Leão) – que também se sai bem como possível cara-metade de Alice –, fico pensativo quanto ao beijo que apenas quase rolou entre ele e a protagonista, mas que rolou pra valer entre João e a “Mulher Maravilha”. Não se trata de uma apologia à traição, mas fico me questionando sobre esta mulher moderna, empreendedora e independente que, contraditoriamente, não se atreve nem a um beijinho com uma bela figura como Ricardo (Eriberto Leão) à quilômetros de distancia de sua cidade e de sua família. Machismo enrustido em um filme tão libertário ou estratégia do diretor para mostrar que Alice, apesar de sua compulsão pelo trabalho, é fiel à sua família? Vai saber...

Aliás, no tocante ao mencionado aspecto libertário do longa, isso, a meu ver, lhe rende muitos pontos. De pernas pro ar 2 segue provocando o riso sem precisar apelar para o palavreado chulo ou fazer piadas sexistas. O sexo ali é para todos, sem que isso tenha aquele famigerado arzinho de escárnio.

E falando em mulher moderna, merece destaque a criança que interpreta Alice na infância, relatando, para uma câmera, os sonhos que, de um jeito ou de outro – embora de uma maneira bastante torta – se realizam na vida adulta da personagem. Neste ponto, vale fazer uma analogia entre esta Alice, obstinada na busca pela concretização de um sonho – única e exclusivamente para fins de realização pessoal – e aquela outra Alice, personagem de Lewis Carroll. É óbvio que são estórias totalmente distintas, mas ambas estão envoltas em sonhos e fantasias, e são justamente essas fantasias (num sentido malicioso, no caso de De pernas pro ar 2) que as conduzem ao amadurecimento. Aliás, em ambas as estórias, um coelho é o grande responsável por tudo... Em se tratando de filmes e, principalmente, obras literárias, nomes nem sempre são casuais. A personagem de Christine Fernandes, por exemplo, não se chama Vitória devido a uma escolha arbitrária, mas, sim, para reforçar para o telespectador a representação que aquela mulher tem para Alice. Ou seja: a mulher vitoriosa por dar conta do recado em todos os âmbitos de sua vida.

E foram justamente os sonhos de menina da protagonista os responsáveis por uma rápida solução para o final do filme. Uma solução que, na verdade, deixa muita coisa mal resolvida, vista a lógica de que Alice não vai mudar, continuando isso a ser prejudicial a si mesma, ao seu casamento e, em especial, ao seu filho. Por outro lado, não sei se esse tipo de exigência cabe a uma comédia. E, além disso, esse desfecho meio vago vem a ser positivo se for sinal de uma possível continuação. Então, enquanto o terceiro filme não vem, vamos ao cinema rir a valer com as brejeirices da protagonista e dos que a acompanham, e, se tivermos que tirar uma lição do filme, que seja a de que o bom é que vivamos a nossa vida de pernas pro ar...

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Publicado originalmente em CinePlayers.

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