sábado, 21 de maio de 2016

Estrela da Manhã - André Vianco



“Rafael não sabia naquela época e nem agora que às vezes a distância chega e ela é, como Estrela da Manhã, um tipo de demônio que vai se infiltrando na família devagarzinho, de forma bastante silenciosa. A distância é um demônio que não tem cheiro nem volume, mas que também esfria o ar ao redor dos que são possuídos por sua presença e, quando os corações se dão conta, já estão duros ou doloridos demais para lutar. Refazer o caminho é um ato de fé. Reencontrar entes queridos e amigos da infância a um passo é um esforço que não deveria ter esse nome. Às vezes o demônio se vai, às vezes, não. Mas o fato é que, bem ou mal, Rafael os tinha ali, ao final do dia, quando chegavam de seus afazeres do mundo e, dentro de casa, queriam continuar lá fora, com suas mentes plugadas no que tinham vivido e ouvido e pouco se importavam com os que estavam no entorno, dentro das paredes físicas do lar. Comida congelada girando no micro-ondas e as falas monótonas da novela das nove grasnando na TV.” (p. 220-221)