sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Chouchou

Título original: Chouchou
Ano: 2003
Direção: Merzak Allouache
Roteiro: Gad Elmaleh (esquete original e roteiro), Merzak Allouache (roteiro)
Gênero: Comédia
Origem: França
Duração: 105 minutos

Se eu tive o grande prazer de conhecer “Chouchou”, foi devido a um vago comentário de um grande amigo. Deu no que deu: “Chouchou” me conquistou pela delicadeza e simplicidade, já apresentando aqui as características que são a essência do filme. Um longa-metragem totalmente despretensioso, por mais difícil que seja considerar essa uma definição pertinente a qualquer obra que aborde temas tão sérios. Explico: “Chouchou” aborda a questão da homossexualidade (que é séria por, incrivelmente, ainda ser tabu) e do travesti (que vive a ser encarado em nossa sociedade com base em uma série de estereótipos), permitindo-se à ousadia de levar tudo isso para dentro da igreja catóe levar tudo isso para dentro da igreja catase em uma slica! Isso, certamente, não lhe parece pouco se você sabe que a Igreja - com todo o respeito que lhe é devido -, de um modo geral, concebe ainda a homossexualidade como perversão, sendo o seu praticante condenável ao fogo do inferno. Equivoca-se, porém, o leitor que, não havendo asssistido o filme, lê o presente comentário e faz de "Chouchou' a idéia de um filme polêmico. Esta delicada obra de Merzak Allouache, adaptada da peça teatral de Gad Elmaleh (que interpretou o protagonista em ambas ocasiões), em momento algum polemiza o tema. Polêmicas são as discussões que o filme sugere.


"Chouchou' é para mim o melhor exemplar da minha concepção pessoal de "filme libertário" na medida em que apresenta situações inverossímeis no contexto da sociedade atual (as mencionarei logo a diante) de modo a imediatamente ocasionar no telespectador a reflexão acerca da representação que a relação homossexual teria, na vida real, nos contextos apresentados pelo filme (a família, a igreja, os amigos). Eu mencionei situações inverossímeis. Pois bem: "Chouchou" não só leva a questão da homossexualidade para dentro de Igreja, como eu disse, como também para o contexto familiar, porém de forma tranquila, livre de dramas. O fato de Stanislas (Alain Chabat) levar Xuxu (Gad Elmaleh) para conhecer seus pais apresenta-se como algo absolutamente natural, tanto que, quando ambos estão a caminho do restaurante onde os pais de Stanislas mantêm-se à espera, a preocupação de Xuxu não é com a possibilidade de não ser aceito pelos futuros sogros por ser homossexual etc. e tal. Sua preocupação é tão somente com a possibilidade de não agradar como a namorada de Stanislas. Coisa que, aliás, não acontece. A empatia entre Xuxu e os sogros é imediata. Fico pensando nos jovens da minha geração, que tantos dramas viveram ou vivem no tocante ao posicionamento de suas famílias a respeito de sua orientação sexual.


Ainda em se tratando das tais situações, temos também a simática Dra. Nicole Milovavovich (Catherine Frot), que, ao meu ver, não é psicoterapeuta por acaso. O que temos aí é uma metáfora para a urgência de compreensão da questão da homossexualidade. O psicoterapeuta, espera-se, possui uma mente aberta para assuntos como esse, dado o seu conhecimento teórico sobre o mesmo. Interessante observar que no único momento em que Xuxu fala, com seriedade, sobre a sua orientação sexual para a Dra. Nicole, essa ópta por não estender o assunto, apenas autorizando Xuxu a, a partir do dia seguinte, apresentar-se em sua casa como a sua secretária, Srta. Xuxu, o que nosso protagonista faz de bom grado. E temos,mais uma vez, o filme tentando nos passar a sua mensagem libertária: "Este não é um assunto ao qual se possa polemizar. Não há nada a discutir sobre, pois se trata de algo comum".


E, finalmente, temos a atuação de Claude Brasseur como o Padre Léon, que, em nenhum momento, dirá "sim' ou "não' à forma de Xuxu viver a vida, apenas acolhendo-o enquanto ser humano que necessita de amparo. É esse o papel da Igreja, não? Em uma bela cena em que nosso protagonista procura o Pe. Léon para se confessar, apresentando o seu desejo de se casar com o seu amado naquela igreja, tudo o que o padre faz é chorar após ouvir atentamente, sendo essa, talvez, a expressão de sua emoção diante da manifestação de desejos tão singelos e dignos por parte de Xuxu... singelos, porém impassíveis de viabilização no âmbito da Igreja como um todo.


Enfim, nada em "Chouchou" está alí à toa. Nem mesmo o paciente maluco de Dra. Nicole, que cisma em perseguir Xuxu. Somente o telespectador atento, no entanto, pode se dar conta disso, tão simples e hingênuo o filme aparenta ser. Aliás, o diretor ópta por manter o clima de peça teatral, o que possibilita a naturalidade e comicidade no tratamento do tema central. É possível que as minhas considerações dêem a entender que eu considero "Chouchou" uma obra-prima do cinema. Por Deus, não é. Longe disso, aliás. Ele é digno de tais considerações tão somente por ser simples, porém inteligente e útil. Aliás, o filme tem lá os seus defeitos, como o comportamento e a falta de simpatia do protagonista em diversas situações. De um modo geral, porém, Gad Elmaleh defende bem o seu Xuxu, cheio de trejeitos e manias cativantes. Xuxu é isso: um filme sem polêmica e sem tragédia que apresenta, sem superficialidade, o sonhado comportamento da sociedade em relação à diversidade sexual.


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