domingo, 10 de novembro de 2019

O florescer masculino

“É pra hoje, Alex!” Ele vociferava, enquanto eu esperava me sentir realmente preparado para o próximo mergulho. “Errou, tenta de novo uai”. Disse ele quando eu reclamei ser muito difícil me colocar de pé sem me apoiar na raia. “Engoliu, só reza e continua.” Foi ele quando eu, dramático, engoli um pouco d’água.

Percebendo as consequências do sedentarismo a cinco primaveras para os quarenta, vi na natação uma boa alternativa, e lá fui eu, sendo conduzido por um instrutor para o qual, aparentemente, eu perdi o caráter de “iniciante” já na terceira aula.

O curioso, porém, é que são as atitudes dele e de caras como ele que me têm ensinado a gostar de homem. Mas não me refiro ao gostar no sentido afetivo ou sexual da coisa, até porque, convenhamos, essa tendência já faz parte de mim desde moleque, e não é lá uma grande novidade pra ninguém. O gostar ao qual me refiro aqui tem outras nuances, significados mais profundos que eu venho aprendendo após muito resistir ao masculino em mim e no outro.

Na minha experiência pessoal, são os homens os que mais me desafiam, exigindo de mim firmeza, objetividade e me fazendo tomar novo fôlego – literalmente, no caso da natação – quando me parece não ser mais possível.

Desde a mais tenra idade, sempre me cerquei de mulheres, todas elas se havendo dedicado magistralmente a me instruir na arte da sensibilidade, do altruísmo, da humanidade, da leveza, da consciência do próximo. Sim, tudo isso eu aprendi, sobretudo, com mulheres. O problema é que, excelentes professoras que elas são, me acomodei em seu amparo, refugiando-me em sua generosidade e acolhimento sempre infalíveis, sem necessariamente me dar conta disso.

É fato, no entanto, que determinados desafios com os quais a vida costuma nos surpreender me foram/vêm mostrando a necessidade de ancorar o masculino e o feminino em mim. O Yin e Yang. As duas facetas de um Deus que, na condição de mãe e de pai, ora é amparo e misericórdia, ora é Aquele que nos lança os duros desafios que nos colocam em movimento.

Esse processo contra as resistências, no entanto, é lento e gradual. Começou timidamente, com a coragem de encarar um psicólogo do sexo masculino, por exemplo. Avançou para o estreitamento de laços com amigos que, seguros de si, não veem em mim uma ameaça à própria sexualidade. Em seguida, maior aproximação com o meu pai, ainda longe do ideal – se é que existe um –, mas significativa se comparada a tempos de outrora.

Se das mulheres eu aprendi a sensibilidade, dos homens eu pretendo a objetividade e a firmeza. Mas não aquela firmeza característica de uma masculinidade tóxica que, felizmente, tem cada vez menos lugar no mundo. Refiro-me à firmeza que me permite aterrissar quando as asas da emoção me impulsionam a um voo interminável, livre e inconsequente.

Nos relacionamentos amorosos (ou tentativas de), eles têm se mostrado eficazes não na arte de me amar, mas na de me ensinarem a amar a mim mesmo antes de qualquer coisa, não raro me trazendo das nuvens para a terra firme, que é onde se  pode edificar algo de grandioso, duradouro e real.

Sim, eu gosto de homem. E continuo a gostar das mulheres. Agora, porém, sem negar nenhum dos dois. Vou oscilando entre esses dois polos, sendo extremamente organizado, mas desleixado com os serviços de casa; vestindo saia e mantendo a barba lenhador; não raro pensando com a cabeça de baixo, mas ainda escrevendo longas cartas de amor.

Este sou eu, aprendendo a ser livre, aprendendo a ser gay, aprendendo a ser homem. Aprendendo, a cada dia, a me descobrir e a expressar no mundo aquele que eu sou.

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