quarta-feira, 10 de junho de 2020

A sua Resistência não joga pra perder. E você?


 

Se você já participou de alguma vivência de coaching, você deve conhecer ou até mesmo haver participado da dinâmica da madeira.

Ela funciona assim: depois de haver manipulado as emoções dos participantes com a sua exposição, o palestrante convida um voluntário ao palco solicitando-lhe que escreva em um pedaço de madeira aquilo que considera como sendo seus defeitos, obstáculos ou qualquer coisa que deseje vencer em sua vida. Feito isso, o palestrante posiciona a madeira diante do voluntário para que este – depois de muito suspense e ao som de Eye of the Tiger e dos gritos de incentivo da plateia – quebre o objeto.

É uma dinâmica de empoderamento (enfoderamento, eu diria) que, naturalmente, simboliza a vitória sobre tudo aquilo que nos impede de atingirmos as nossas metas.

Há algum tempo, tomado por uma paixão que, junto de várias outras coisas, compunha um pacote cujo peso me rendera um efeito colateral chamado depressão, ouvi de meu terapeuta o seguinte: “O João é algo no qual você deposita a sua energia como forma de fugir àquilo em que ela realmente deve ser investida. O João é o demônio que o impede de enxergar aquilo que você realmente é”.

Na ocasião, eu compreendi, naturalmente, a metáfora utilizada pelo meu terapeuta para algo que eu fazia inconscientemente (e às vezes nem tão inconscientemente assim...). Só recentemente, no entanto, ao ser abençoado com a leitura de um maravilhoso e outrora subestimado livro de Steven Pressfield – A Guerra da Arte – pude ter uma compreensão completa dos dizeres do meu nobre terapeuta.

O referido autor chama de Resistência toda e qualquer força que, sutilmente, procure nos dissuadir de realizar aquilo que vai nos elevar – e, por conseguinte, elevar o mundo à nossa volta – a um novo patamar de consciência. Uma força que não age contra nós em especial, mas contra qualquer movimento para o alto, vez que quer manter as coisas como estão ou, se possível, piores. Você já deve ter ouvido dizer que “para descer, todo santo ajuda”, certo?

Lembrei-me de quando a minha sempre tão sábia irmã me chamou a atenção para a atuação dessa força quando eu considerei mudar de emprego justamente quando vislumbrei a possibilidade de uma promoção... que realmente aconteceu.

Sim, o meu terapeuta, como de hábito, tinha razão: trata-se do demônio, equivocadamente representado como um cara vermelhinho, com chifres e rabo pontiagudo. A Resistência é um demônio que age com muito mais sutileza. Um demônio cuja arma não é um tridente, mas outra muito mais afiada, como uma depressão, uma distração, um efêmero prazer ou mesmo como aquela desculpa muito bem fundamentada para que deixemos para amanhã a tarefa que, por ser a missão de nossa alma, tem urgência de ser realizada.

A Resistência é Mara empenhado em impedir a iluminação de Buda sob uma árvore de rudraksha. A Resistência é o diabo a tentar Jesus em meio ao deserto a fim de dissuadi-lo  de ser Deus para ser homem. A Resistência é obstinada, e se esses grandes mestres a venceram, não foi para que nos lembrássemos deles como fodões. Eles superaram há muito esse tipo de vaidade. Eles a derrotaram como forma de nos deixar um legado, lembrando-nos sempre do nosso potencial para também vencermos a força que, dia após dia, nos impele para trás enquanto nadamos contra a corrente.

“Não deis lugar ao diabo” (Efésios 4.27), já nos diz o texto bíblico, pois é preciso que sejamos bons nadadores. Não para lograrmos medalhas, mas porque, ao alcançarmos a margem, a humanidade inteira ganhará novo fôlego junto de nós. Manter o foco naquilo que há de nos realizar como seres humanos é, portanto, quase um ato político, que torna plausível a utilização daquela famigerada frase em um contexto muito mais nobre.

“Se fere a minha existência, serei resistência.”

É bem isso. Em lugar de cedermos à Resistência, resistirmos a ela diligentemente, visando trazer à baila aquilo que somos em essência. Isso sim é lutar pela própria existência.

E lembre-se: quanto maior for a Resistência, maior é a urgência de superá-la. Quanto mais rígido for o pedaço de madeira, maior há de ser a felicidade da qual toda a humanidade gozará quando, finalmente, o fizermos em pedaços.

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